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quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O SALÃO BRAZIL na Baixa Coimbrã

Mas quem não chegou lá a Jogar Bilhar?
Falar neste antigo salão de bilhares é reviver memórias do centro histórico. Na sua época áurea, até meados da década de oitenta, do século passado, o Salão Brazil e a Baixa, caminhavam lado-a-lado. Nesse tempo, este primeiro-andar, no Largo do Poço, era o catalizador, o modelo que mostrava as alterações, no interagir desta zona da cidade, embora, aparentemente, tudo se mantivesse igual, sem reacção.
Era aqui que confluíam todas as classes sociais da cidade, desde o “Zé dos alicates”, o “Zé cigano”, o João, hoje médico, com as suas habilidades exímias no bilhar, o Romão, o João das Galerias Coimbra, e outros que não lembro. No pano verde do Snooker, a jogar à “pool”, à “série”, ou à “seguidinha”, não havia diferenças classicistas. Desde que se tivesse dinheiro e se cumprisse as regras, qualquer um podia ser comparte em qualquer um daqueles jogos. Sobretudo das 13 às 15 horas, horário do encerramento do comércio para almoço, e depois das 19 horas.
Após o fecho das lojas, o Salão Brazil tomava a efervescência das bolsas de Nova Yorque. A controlar o movimento, o velho Juvenal, regulador do índice Dow Jones. Se ele estava presente o índice subia, se hipoteticamente ele faltasse uma qualquer vez, o ambiente iniciava uma queda de vários pontos. Embora, saliente-se, ao longo da sua vida profissional à frente deste salão de bilhares, tenho a certeza que era possível contar pelos dedos das mãos as vezes que ele faltou ao trabalho.
Falar do velho Juvenal não é fácil. Não porque ele fosse um personagem interactivo com a heterogénea clientela. Nada disso. Era um homem bom, pacato, simples, e que falava pouco. Naquele salão todos os frequentadores sentiam que aquele homem simbolizava o respeito. Para além de facilitar o pagamento de uma bica e um bolo, porque no momento não havia dinheiro, era um bom ouvinte. Naquele espaço de tertúlia comunitária e de jogos, aquele homem, quase iletrado, era o ombro amigo, o psicólogo, o animador social. Ai de quem faltasse ao respeito ao senhor Juvenal. Se, por exemplo, aparecesse uma cara nova no salão e se começasse a “armar”, a clientela diária, como polícia de costumes, mantinham-no “debaixo de olho” e, ao mínimo deslize, os tacos de jogar bilhar virados ao contrário, depressa se tornavam cacetes de basebol.
O velho Juvenal morreu velhinho, há cerca de 15 anos. Certamente por coincidência, com o seu desaparecimento, o velho salão encerrou e a Baixa, como sentindo a sua falta, numa solidão continuada e carregada de uma inultrapassável dor, iniciou o seu declínio.
Há cerca de quatro anos, como que a iniciar a recuperação desta zona monumental, o Telmo (o actual dono), conjuntamente com o “Manel”, reabriram o Salão Brazil. De uma forma inteligente, uma vez que os computadores fizeram passar à história os jogos de salão, arrumaram os velhos Snookeres, deixando apenas um para memória futura, e fizeram um bonito restaurante “art Deco”. Para além disso, estabeleceram um protocolo com o Clube Jazz ao Centro, sob a direcção de Pedro Rocha Santos, e hoje o Salão Brazil, com o seu arrojo vanguardista, é um bom exemplo de uma revivificação que se deseja para a Baixa.
O Salão Brazil pode perfeitamente ser para esta ínclita zona comercial o início de uma recuperação que todos desejam, a frente de uma guarda avançada, a renovação de um marasmo que urge abanar.
Tenho a certeza que o espírito do velho Juvenal, esteja onde estiver, estará a torcer pelo sucesso do seu antigo companheiro de vida, o seu amado salão, e pela revitalização da Baixa de Coimbra.
Luis Fernandes-Burriqueiro

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2 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Muito interessante este narrar da vida do salão Brazil.
Algumas vezes, muito poucas,ali joguei bilhar, apenas pelo prazer de jogar.
Durante cerca de 8 anos anos frequentei a Brasileira,na Rua Ferreira Borges, em função da vida profissional da minha mulher, farmacêutica naquela artéria da Baixa Coimbrã.
A Brasileira, café da cidade onde se juntavam muitos dos intelectuais da nossa urbe, desapareceu, e com ele um pouco da memória de Coimbra.
No 1º andar existiam 2 mesas de bilhar, e recordo aqui que na nossa cidade havia uma "trupe" de profissionais, cuja vida práticamente se confinava a um pano verde de uma mesa de bilhar de manhã à noite. Vidas cinzentas, de gente muito simples, mas que para além das discussões da "poole", era solidária entre si...
Aos nomes que mencionou acrescento mais dois: O "risco" e o "tarzan".
Quito

3:07 da tarde  
Blogger Isabel Melga disse...

Desculpem-me se me repito, mas foi giro falar-se do Salão Brasil, era um local e uma sala até há uns tempos interdita a senhoras e à noite nada recomendável passar sequer naquelas artérias. Felizmente com as Sessões de Jazz e com as obras introduzidas nesse Salão já fui com um grupo grande de amigos ouvir uma das nossas meninas cantar Jazz e adorei aquela noite, pelas características do Salão, pelo ambiente diferente dos Cafés convencionais, enfim talvez pela novidade, o certo é que fiquei fã. O aniversário do meu filho foi lá e depois ficaram para mais uma sessão de Jazz. Seria uma grande alegria ver a nossa Baixa ressuscitada e com aquelas casas restauradas e com gente!!! Tanta cidade que com umas ruelas como as nossas já teriam explorado para comércio, bares e seria até uma fonte de rendimento para o Turismo e uma mais valia para aquelas pessoas que sempre ali viveram mas que continuam rodeadas de cheiro a bafio, a ratos, enfim, uma degradação que custa a ser sanada apesar de projectos e de promessas.
Temos de reconhecer que os Coimbrinhas são muito de se encostarem à Parreira e aguardarem por um milagre da Rainha Santa! Temos uma Cidade com tantas potencialidades, espaços envolventes de mão beijada, era só haver vontade política! Mas como agora estão na moda outras causas que dão dinheiro e prestígio não a Coimbra mas a certas personagens e empresas, continuamos a ser uma cidade esquecida no tempo! É revoltante e lamnetável. Só pela inovação e pelo arrojo, Viva o Salão Brasil, votos de muitos êxitos para ele.

1:20 da manhã  

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