<

sábado, 28 de março de 2009

O 24 de Março


Que bonita, digo-o com confessada nostalgia, a lembrança deste emblema-símbolo. A ele associo sempre o despertar estruturado da minha consciência política. Ficou-me para o resto da minha vida, como simbolo da vontade de mudar na esperança que a ditadura não seria, por não poder ser, eterna. Talvez, por isso, nunca sofreu de velhice na minha memória. Não troquei, nem troco, o seu brilho de traço singelo por uma qualquer t-shirt neo-market que lhe queira competir em projecção dos meus ideais de juventude, aquela em que aprendi a lutar.

Mas confirmando que não há bela sem senão, este emblema lembra-me um dos seus usos vis. Em 1964 (ou 65?), uma manifestação estudantil de que fazia partia subia a Rua do Carmo gritando pela libertação de estudantes presos pela PIDE. Seríamos umas três centenas, a concentração tinha tido lugar no Rossio e dirigia-se (quem se terá lembrado de tão temerário destino?) rumo ao Chiado para entregar a expressão da nossa exigência aos donos da PIDE na António Maria Cardoso. Reparei então que frente a uma papelaria no começo da Rua do Carmo um grupo de maduros corpulentos se riam e ostentavam nas lapelas dos casacos chapinhas metalizadas dos emblemas do “Dia do Estudante” (aqui reproduzido). Vi ali um mau augúrio que demorou escassos minutos a vê-lo transformar-se em brutalidade chã. Á uma, os pides-provocadores sacaram das matracas guardadas nos sovacos e desataram à bordoada, dispersando-nos pelas escadas do sopé do Elevador de Santa Justa, procurando atinguir sobretudo as raparigas e dedicando-se a arrastar pelos cabelos aquelas que iam caindo ao chão. Como estava combinado, aquele grupinho de torcionários contava com a presença próxima, que logo se fez sentir, dos polícias de choque que já tinham cercado e isolado a zona, fazendo depois a limpeza final. E a manifestação morreu ali.

Ao fim e ao cabo, ambas as lembranças, a da força simbólica maior da luta estudantil contra a ditadura que me marcou o rumo político e a imagem persistente da sua presença obscena nas lapelas dos pides-provocadores da Rua do Carmo, unem-se na minha memória o suficiente para a tornar inesquecível.
João Tunes
in Caminhos da Memoria

8 Comentários:

Blogger Manuela Curado disse...

Que a esperança e o desejo de mudança permaneçam no teu coração.
Um trabalho árduo nos espera.
O mundo continua, ainda, mais cruel e injusto.

9:14 da manhã  
Blogger RI-RI disse...

Convém que não caia no esquecimento.
Convinha que nas escolas se falásse disto mas...
Temos que ser nós.

9:58 da manhã  
Blogger Isabel Melga disse...

[[Que bonita, digo-o com confessada nostalgia, a lembrança deste emblema-símbolo. A ele associo sempre o despertar estruturado da minha consciência política. Ficou-me para o resto da minha vida, como simbolo da vontade de mudar na esperança que a ditadura não seria, por não poder ser, eterna. Talvez, por isso, nunca sofreu de velhice na minha memória. Não troquei, nem troco, o seu brilho de traço singelo por uma qualquer t-shirt neo-market que lhe queira competir em projecção dos meus ideais de juventude, aquela em que aprendi a lutar]].
Oxalá estas palavras sejam lidas por muitos sobretudo pelos mais novos e nós temos o dever e a missão de continuarmos a lembrar estas datas aos que nos estão próximos e de falar nelas através destes veículos prodigiosos da tecnologia! Os Blogs são, segundo o meu pequeno Universo, dos tesouros mais válidos para abrir as mentes e ligar as pessoas sem interesses subjacentes, sem pretensiosismo. De uma forma muito próxima muito pessoal e humana. Fiquei logo com outra energia para voltar às minhas lides familiares. Até logo Isabel Melga

1:42 da tarde  
Blogger Rui Felicio disse...

Andava eu no 2º ano de Direito. Fui a Lisboa para participar na manifestação que aqui é descrita.
Preparado para dizer ( não foi preciso... ) que ia passar uns dias a casa do meu tio na Av. EUA com a finalidade última de ir ver a Académica com o Sporting que se ia realizar por aqueles dias.
Tudo isto me veio à lembrança.
Lembrei-me também que naquele tempo tinhamos que estar preparados com uma desculpa esfarrapada para num primeiro embate a darmos aos esbirros do regime. Como aquele que eu levava engatilhada.
Apenas e só porque nos era proibido o "crime" de manifestarmos a nossa oposição ao regime.
Mas mais do que todas estas lembranças aquela que me deu maior alegria e saudade foi o ter visto a imagem da nossa luta aqui estampada naquele simbolo inesquecivel das cordas entrelaçadas que representavam a nossa união e ao mesmo tempo as grilhetas com que o regime nos tentava manietar.

Maus tempos
Bons tempos

Rui Felício

6:17 da tarde  
Blogger olinda Rafael disse...

Mais uma vez recordo as lutas estudantis de 62 e 69,em Coimbra,
onde participei com a juventude e
garra ...

Olinda

7:59 da tarde  
Blogger Manuela Curado disse...

Desculpem... mas hoje,tantas ou MAIS razões há, para começar de novo a lutar.
Se quizerem têem parceria.

8:10 da tarde  
Anonymous CHICO disse...

a boba não se cala. disparates, disparates e mais disparates:)))

8:24 da tarde  
Blogger joca disse...

Chico não tens vergonha de chamar boba à rapariga.
Gostavas de escrever como ela.Tu e eu somos uns nabos. Não temos jeiteira nenhuma para isto.

11:02 da tarde  

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial

Powered by Blogger

-->

Referer.org