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domingo, 7 de outubro de 2012

Recordando José Hermano Saraiva



Li com atenção um trabalho que recentemente o DL publicou, sob este título e assinado por Manuel Augusto Dias, ao que sei um historiador natural do nosso distrito. É na qualidade de conhecedor da vida e da obra de JHS, e de testemunha ocular de factos, que passo a transmitir uma opinião muito divergente da expressa por esse autor, porventura bem mais fundamentada do que aquela que verteu.

Concordo com MAD quando afirma que JHS foi um bom comunicador e que terá divulgado a História de Portugal. No entanto, o seu labor nunca se repercutiu nos meios científicos portugueses, ou mesmo no mundo, pesem as traduções da sua “História Concisa”. A comunidade académica também nunca deu relevo especial às suas historietas, havendo muitos outros historiadores contemporâneos de maior projecção técnica e moral, até mesmo em Leiria.

Porém, para conquistar o Panteão Nacional – ao lado de Alexandre Herculano e deixando de fora tantos ilustres historiadores -, seria necessário que o espectro de JHS não carregasse gravíssimas falhas doutrinárias e de carácter, que o colocam claramente na vala comum da “história negra de Portugal”.

Ao contrário do que MAD escreveu, JHS não teve de “enfrentar a crise académica” de 1969, em Coimbra, Porto e Lisboa. A verdade indesmentível é que, enquanto ministro fascista, e pertencente à “ala dura” do regime, foi o principal responsável pelo desencadear dessa tremenda crise. Suportado na PIDE que lhe parecia frouxa, e tendo por isso recorrido também à PJ, dirigiu pessoalmente a repressão estudantil que conduziu dezenas de jovens à prisão e a incorporações compulsivas no Exército, além de inúmeras perdas de anos escolares, bolsas de estudo, isenções de propinas e “exílios” nas guerras coloniais e no estrangeiro. Curriculum vergonhoso este, de que nunca se retratou, e que não pode ser apagado pela invocação de um “exílio interno”, após o 25 de Abril, na paradisíaca Nazaré.

Escrevi recentemente um livro em que, como cidadão e testemunha, tratei JHS com a verdade, o rigor e o respeito com que ele nunca tratou os factos históricos, durante toda a sua vida académica. Por isso não temerei aqueles que, como MAD sugere, distraidamente “advoguem” que JHS seja transladado para o Panteão Nacional. “Advogados de defesa” que, a não deixarem a alma do morto em paz, terão certamente de enfrentar centenas de “advogados de acusação” e testemunhas em cólera, vítimas da sua prepotência e arrogância e da sua insensatez.

Em nome da justiça e da verdade histórica, vilões como Hitler, Estaline ou Pinochet não passaram de déspotas a iluminados, apenas por terem fechado os olhos. O mesmo princípio se aplica a JHS, por mais cambalhotas que tenha dado. Por mim, mais facilmente aceitaria Salazar no Panteão Nacional, porque esse, ao menos, não era um troca-tintas: para recordar, sempre preferi quadros originais, e de traço firme, a fotocópias de mau gosto. Vergada por uma história pessoal que teve aspectos tenebrosos, tenho a certeza que a verdadeira História esquecerá, e depressa, e silenciosamente, esse tiranete lusitano sem tempo nem alma, que se chamou JHS.

Cândido Ferreira

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